Gui Palacios
Sacerdote de Umbanda
- INTRODUÇÃO
Este artigo tem o intuito de apresentar um conceito sobre a personalidade transformada pelo Espírito Santo, parte de uma pesquisa bibliográfica para apresentar os conceitos mais relevantes da Teoria Histórico-Cultural como contraponto necessário de análise qualitativa ao compreender a sociedade como um mundo humano concreto. Na superação desta teoria, como parte de uma transcendência desses conceitos do materialismo dialético ao ser o ponto de partida para a compreensão sobre o processo de formação da personalidade, realizamos sínteses qualitativas para contribuir com a abordagem teológica sobre o conceito de personalidade. Uma produção de conhecimento teológico que dialoga a partir de experiências e vivências espirituais necessárias para romper com os conceitos materialistas sobre a sociedade, ir além das relações humanas imediatas, sociais, culturais, históricas e contemplar o devir da comunhão com Deus em um mundo espiritual.
Há uma indagação sobre quem poderá compreender a dinâmica das relações humanas que pertencem a um plano transcendente ao mundo concreto para podermos ter outra perspectiva, a qual poderá ser inquietante sobre a personalidade e ação do Espírito Santo. Compreender quais são os processos humanos da formação da personalidade e seus traços característicos que podemos identificar como fio condutor da formação subjetiva do indivíduo como sujeito em sociedade.
Como ponto de partida metodológico, pesquisamos e a analisarmos os conceitos mais relevantes da Teoria Histórico-Cultural ao qual foi importante para nos aprofundar em uma questão que esteja isenta de dogmas e doutrinas própria das religiões, mas não está neutra em sua concepção ideológica. Encontramos um conhecimento científico estruturado em uma argumentação válida, e consideramos como contraponto capaz de ampliar os conceitos relevantes e importantes sobre a formação da personalidade. Consequentemente consideramos como poderia participar da formação da personalidade o pensamento lógico, abstrato e concreto. Desta maneira de abordar o tema sobre a formação da personalidade como parte das interações sociais e culturais que surgem na criança e no adolescente como um produto de uma sociedade histórica e cultural.
A metodologia utilizada neste artigo visa analisar qual a lógica que será capaz de compreender tanto de forma científica, filosófica ou teológica e que não se perca em um pensamento doutrinário, dogmático ou racional. Ou ainda que seja aceitável como fundamento para que possamos identificar quais os traços da personalidade que são impactantes na pessoa e suficientes para a compreensão do Espírito Santo. E, finalmente, respondermos se o Espírito Santo é uma pessoa.
Enfim, ter uma determinada personalidade implica ter condutas e formas de pensar próprias para interagir com o outro e desenvolver atividades para a sua inserção na sociedade. Ao atuar e agir conforme uma ideologia dominante, o sujeito pertence a uma cultura para se enquadrar como parte da sociedade. E, encontrar um sentido de vida em uma concepção de mundo construída por processos psicológicos de formação de sua individuação. Um processo dialético de aproximação do Espírito Santo como promotor de aprendizagem por acrescentar ao indivíduo a religação com a centelha divina que nos motiva as transformações da subjetividade e da personalidade, na superação dos desafios da vida para se religar como parte corroborativa da obra de Deus.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Conceitos da Teoria Histórico-Cultural sobre a constituição da personalidade
A Escola de Vigotski[1], formada por Leontiev, Luria e o próprio Vigotski, produziu um conhecimento científico sobre o homem não desvinculado de sua natureza social, um homem concreto que está subordinado à determinada sociedade, história e cultura que são impactantes no desenvolvimento de sua vida, individualidade e personalidade.
A psicologia científica de Vigotski incorpora o conceito-chave de histórico-cultural, fundamental para a compreensão do desenvolvimento do conjunto de funções psicológicas operando no sistema psicológico como uma unidade afetivo-cognitiva. A cultura modifica as funções psicológicas do sujeito em transformação na sociedade. Desta forma, a história do homem concreto tem em sua relação objetal uma atividade produtiva que o transforma, tornando o sujeito em sociedade, de modo que a individualidade modifica-se diante do desenvolvimento cultural em uma determinada história. Portanto, a consciência e a personalidade estão em relação com os objetos (uma relação objetal), pois os instrumentos causam uma relação de dependência de ordem histórico-social para o desenvolvimento da constituição do psiquismo humano. A personalidade acompanha essas transformações conceituais de ressignificação, de modo que modificamos nossa conduta e interesses ao reelaborar novos níveis de consciência e de pensamento.
Leontiev (1978) afirma que as riquezas culturais herdadas historicamente precisam ser apropriadas pelos indivíduos para que as gerações seguintes continuem a desenvolvê-las, num processo de humanização do próprio homem diante da complexificação das relações objetais de sua atividade reprodutora ou atividade criadora de transformação da concepção de mundo por uma dada sociedade contida histórico-culturalmente. Pela apropriação e objetivação das aquisições culturais que o indivíduo torna-se humano e se insere na sociedade ao interagir em grupos sociais.
No processo de educação e apropriação da cultura humana acumulada, na educação não formal, familiar e com outras crianças, nas religiões ou em grupos sociais a aprendizagem se dá, num primeiro momento, como imitação dos atos realizados por outras crianças e do mundo dos adultos. Esse modo simples de imitação, para que a criança se insira nos grupos sociais, por meio de interações acontece o processo de aprendizagem e humanização, um processo contínuo de aprendizagem, porém mediado pelas relações sociais de interação humana. Em um segundo momento, o processo de aprendizagem passa do plano familiar para ser institucionalizado pela escola, com a entrada da criança no processo de escolarização.
A educação formal, em suas relações organizadas num sistema educacional de uma dada sociedade, apresenta outro processo de aprendizagem cujas mediações simbólicas em relação ao conhecimento fazem parte do trabalho educativo e da prática social do professor em uma comunidade escolar. Há outras formas de promover a aprendizagem, mas que dependem da habilidade de leitura e escrita, por exemplo, a compreensão e interpretação do gênero textual ampliam as potencialidades cognitivas para a formação de um pensamento em conceitos. Também, a aprendizagem ocorre quando prestamos atenção nas explicações, ao realizar uma atividade manual, uma avaliação, na preparação de um seminário, nos debates, e em outras práticas que envolvam relação de estudo como atividade.
Assim, não tem sentido, de acordo com este referencial teórico, compreender os processos de aprendizagem como uma linearidade sequencial de conteúdos, fragmentada em partes do conhecimento para que depois de um tempo de exercício essas partes de habilidades adquiridas sejam juntadas e coladas para compor um processo de ensino que requer uma sequencia didática fragmentada em seus conteúdos e habilidades que se quer ou espera alcançar. Na apropriação e na objetivação dos significados os conceitos são adquiridos e acontece a produção de conhecimentos científicos integrais ou complexos, filosóficos ou artísticos expressos como uma produção cultural desde que o aluno participe da realização deste processo como parte dele e não como um espectador que assiste o professor em sala de aula.
No processo do trabalho e comunicativo, o homem desenvolveu a cultura ao longo da história, partindo de marcas em ossos ou da utilização de pequenos objetos para a representação de quantidades; desenhos pictóricos encontrados em cavernas narram histórias ou mitos; ideogramas de diversos povos orientais condensam uma ideia ou objeto; nas escritas primitivas surgiram a sistematização e a formação do alfabeto para formar palavras e seus significados; enfim, os símbolos e signos criados pelo homem geraram a linguagem de comunicação, a palavra portadora de significado único ou polissêmico, portadora de conceitos que desencadeiam no indivíduo uma ideia, um pensamento a ser interpretado singularmente pelas funções psicológicas superiores constituintes de sua consciência e personalidade.
Entender a personalidade nessa perspectiva teórico-metodológica de certa forma nos leva a compreender o desenvolvimento do psiquismo humano como produto de um processo de pensamento dialético que opera na lógica dialética de movimento e transformação na dinâmica das teses concebidas para depois ser alvo de crítica e de desconstrução. As sínteses de um pensamento conceitual são reelaboradas em novas antíteses, servindo posteriormente para as análises; enfim, outras teses são elaboradas, podem surgir contradições, há o ponto de viragem, a superação concebe novas teses, e novas contradições podem surgir, em um processo de reelaboração de sínteses. Dependendo do assunto problematizado haverá uma produção contínua de produção de teses, antíteses, sínteses, análises, sínteses.
Mas o pensamento no cotidiano opera de modo caótico e a ordem pode não seguir uma linha sequencial para a sua formação – a ordem nessa dinâmica de natureza do pensamento depende da formação e do desenvolvimento psicológico singular de cada indivíduo, o importante é termos a concepção de que os processos de aprendizagem não seguem a linearidade dos pré-requisitos de forma fragmentária, o desenvolvimento da capacidade intelectual acontece integralmente para compor um pensamento teórico e prático capaz de responder cientifica e organizadamente na práxis científica. Quando acontecem os pontos de viragem, de uma atividade educativa de imitação ou reprodução à transformação para uma atividade de produção, e pela plasticidade do cérebro, ocorrem as neoformações das suas próprias funções superiores, originando outras configurações das funções psicológicas superiores. (DAVIDOV, 1988; LEONTIEV, 1978; VYGOTSKI, 2012a, 2012b, 2013).
A experiência de vida ainda não se aproxima do conceito de vivência, um indivíduo pode passar por muitas situações ou fenômenos durante a sua vida. Experimenta sensações do mundo exterior de tal maneira que o seu mundo interior estabelece a subjetivação empírica para prevalecer mecanicamente como uma relação de objetivação do fenômeno. Na experimentação psicológica, há um excitante que estimula o sistema de reflexos condicionados, seguindo o princípio estímulo-resposta, a ação se constitui para formar o conhecimento empírico ao estabelecer relações de causas (genéticas) e efeitos de um determinado fenômeno, condiciona um padrão automatizado e cristalizado em um processo de reação psicológica.
O conceito de “vivência” tem um sentido dialético e dinâmico de envolvimento e de participação do indivíduo ao interpretar o mundo exterior sob aspectos subjetivos e objetivos. Assim, no pensamento, há a incorporação de significados e sentidos de aspectos subjetivos que dialeticamente com os aspectos objetivos formam qualitativamente novos conceitos e significados para a formação da consciência e da autoconsciência de uma realidade de mundo concreto.
A personalidade como manifestação do desenvolvimento da unidade psíquica de um sistema de funções psicológicas superiores e elementares não se dissocia de seus aspectos subjetivos; as emoções e os sentimentos estabelecem os nexos e relações para desenvolver os aspectos objetivos, constituindo-se uma unidade afetivo-cognitiva.
A educação escolar participa e contribui para o desenvolvimento desse processo de formação das funções psicológicas superiores se entendermos a escola como lugar de aprendizagem; entretanto, não é o único espaço exclusivo e responsável pelo desenvolvimento da formação humana.
Nesta dinâmica de formação da personalidade do Homem, a transcendência da condição humana em sociedade ocorre por outros processos que pertencem ao plano espiritual, um processo invisível aos olhos comuns ou das ciências que necessitam de provas irrefutáveis para acreditar ou formar uma teoria a respeito.
Desde a criação do homem o Espírito Santo acompanha e transforma a subjetividade humana daqueles que buscam um caminho de retorno a Deus, consequentemente a sua personalidade começa a se transformar com a chegada do Paráclito. Em suas ações e interações com o homem, ações internas ou externas, o Espírito Santo tem uma função espiritual ao acompanhar a trajetória da evolução espiritual, uma voz que nos ensina a compreender o mundo a qual pertencemos. Também, nos guia quando estamos em dúvidas ou indecisões, por meio de nossa voz interna nos aconselha, somos outros ouvintes receptivos seja pela revelação ou testificação, ou ainda, seguimos seus conselhos e orientações como servos por compreendermos que ha uma ordem por estamos em comunhão com Deus. Na vida do homem o Espírito Santo opera milagres de cura ou de livramentos para transformar a essência do homem do mundo concreto ao homem do mundo espiritual.
Portanto, o Espírito Santo é a comunhão por ser a unidade entre o homem e Deus, uma unidade comunicante e reunificante em um mistério desvelado para aqueles que aceitam a comunhão e a sua aliança com Deus “como mistério de plenitude de Amor transbordante; no homem, como apelo de transcendência e como êxtase para o Espírito do Amor e da Verdade.” (FARIAS, 2019, p.503)
2.2 Sobre o método do materialismo dialético
Os princípios metodológicos de pesquisa do materialismo dialético utilizam procedimentos da pesquisa empírica para analisar o que há de concreto e fornecer os dados quantitativos para compreendermos uma pesquisa qualitativa. Ao formular uma síntese teórica sobre o objeto de estudo, parte-se de teses conhecidas para buscar a contradição e de situações que contradigam a uma tese já estabelecida. Assim, apresenta uma hipótese de argumentação, ou seja, a antítese surge como uma nova tese e, na reelaboração das sínteses dessas novas descobertas, outras teses substituem as anteriores.
No método do materialismo dialético, o concreto já foi estabelecido como tese, pela sua transformação em outra tese ou teses distintas da inicial, o que indica uma chave para a superação ao compreender os procedimentos metodológicos de pesquisa. “Em todo procedimento metodológico deve haver sempre um elemento de contradição, de superação interna […]” (Vygotski, 2012a, p. 309, tradução nossa).
No processo da lógica do materialismo dialético, a negação da negação é a transformação que descreve muitos fenômenos da natureza, e é o salto ou ponto de viragem de um fenômeno que acontece de forma coesa num sistema complexo. Assim, podemos de maneira muito simplificada dizer que o pensamento empírico opera na lógica formal do tipo estímulo-resposta. Enquanto o pensamento teórico opera em processos da lógica do materialismo dialético, que parte de uma tese para a antítese, pela contradição, nas sínteses das premissas, ocorre uma nova transformação para a superação na elaboração de outra tese.
Nesta compreensão chegamos a um ponto fundamental a respeito da ação do Espirito Santo na transformação da personalidade, para que ocorra uma mudança de posturas e hábitos necessitamos romper com as crenças e opiniões que adquirimos do meio social ao qual pertencemos como pessoa. Romper com conceitos estabelecidos pelo senso comum e mesmo com o pensamento científico por não ser capaz de responder as indagações sobre a vida espiritual para que na superação desses pensamentos possamos recomeçar a vida, um recomeço que requer novas roupas e um outro olhar para aquilo que nos preparamos em sociedade desde criança no ambiente escolar e na formação acadêmica. A ação do Espírito Santo modifica as estruturas do sistema nervoso central, favorecendo o desenvolvimento de novos conceitos e compreensões sobre o mundo ao qual pertencemos, em um processo de superação dos antigos conceitos e das formas de agir perante os demais, processo dialético que transforma a personalidade que podemos caracterizar como um dom de Deus.
2.3 A superação ao marxismo
A matéria é o ponto de partida para a compreensão de nossa existência como ser humano histórico, cultural e social. Kornilov (1931) alerta que não podemos confundir o materialismo histórico-dialético com as concepções da metafísica que é chamada de materialismo metafísico do século XVIII. Na concepção do materialismo metafísico, a matéria é algo pronto e acabado, absoluto por ser um reflexo da perfeição, imutável por sempre existir desta forma por uma determinação sobrenatural, em posição de equilíbrio e imutável.
No materialismo histórico-dialético, a matéria pode ser compreendida em todas as suas dimensões espaciais e temporais, de forma dinâmica, pois a matéria está em movimento, e, por isso, a matéria não pode ser algo pronto, acabado, nem pode ser reduzida a uma particularidade matemática que a determina como modelo quantitativo, ou seja, determinada de forma empírica quantitativa. “Na verdade, a matéria tem diferentes formatos e formas que são conhecidos apenas em movimento, porque o movimento é a principal forma de existência.” (PAVLOV; SCHNIERMANN; KORNILOV, 1963, p. 85, tradução nossa).
A personalidade humana, segundo Kornilov (1931), é explicada pelas leis da dialética. O fenômeno não pode ser compreendido de forma estática, mas em seu aspecto dinâmico para interpretar os fatores de seu comportamento, seja a partir das reações naturais, seja a partir das reações adquiridas, dos seus instintos ou hábitos, de seu temperamento ou caráter. São opostos cheios de contradições em que a dialética nos ajuda a interpretar de outra maneira para superar uma psicologia metafísica que compreende o homem submetido a uma força que torna a sua natureza humana estática dividida em duas partes autônomas: o corpo e a alma (PAVLOV; SCHNIERMANN; KORNILOV, 1963).
O conceito de personalidade, para a Psicologia de Kornilov, parte do estudo das reações humanas para obter as características quantitativas e qualitativas. Seu método reactológico analisa qualitativamente as principais formas de reação: muscular, sensória, discriminatória, seletiva, reconhecimento e de ordem lógica. A justaposição desses dados em relação a sua intensidade, velocidade e ao seu tempo de resposta gera um conceito de concentração da energia ao estímulo que se transforma em movimento e seu gasto energético em reações rápidas ou lentas de tendências ativas ou passivas.
Simplificando, os fatos da vida criam uma conduta do homem em relação ao seu gasto energético, e a sua atividade mental atua como uma atividade reguladora que reflete no organismo o balanço energético do sistema fisiológico e sistema nervoso central para o surgimento das funções psicológicas em atividade. “Este argumento também antecipa o principal ponto de vista da chamada ‘teoria da atividade’ (p.ex., Leontiev, 1975), que se tornou um lema na psicologia soviética muito mais tarde”. (VAN DER VEER; VALSINER, 1998, p. 131).
Ao viver coletivamente, reorganizou suas relações sociais para suprir as necessidades de sobrevivência; ao compreender os fenômenos da natureza de forma ativa, no ato de pensar e utilizar ferramentas para transformar o meio ambiente em meio social, ocorreram mudanças do homem natural das cavernas que segue seus instintos e emoções conforme as leis da natureza para o homem social racional que, determinado pela razão humana, constrói a sua história e cultura.
Das condições externas impactaram em mudanças internas, um processo de aprendizagem essencial para o desenvolvimento do psiquismo humano. As ferramentas utilizadas como instrumentos de transformação do meio ambiente desenvolveram as capacidades intelectuais do homem devido ao processo de aperfeiçoamento tecnológico desenvolvido historicamente que requer um aprimoramento das técnicas e habilidades próprias do conhecimento científico, nos processos comunicativos o homem aprende a dominar culturalmente o uso de instrumentos materiais e imateriais.
Ao idealizar maneiras de uso dos instrumentos, o pensamento abstrato opera com os símbolos e signos adquiridos em sua vivência objetiva para a apropriação do conhecimento científico e cultural para encontrar outras finalidades de utilização prática e social na relação com os objetos como parte da vida humana para as transformações de determinada sociedade. Entretanto, para a aquisição desta bagagem cultural e superar o que chamamos de homem da caverna, o processo depende da inserção do homem na sociedade por meio dos estudos e de sua formação intelectual apropriada na academia ou no trabalho. Não ocorre de maneira imediata ou espontânea o desenvolvimento das funções psicológicas superiores.
Operando conjuntamente com suas funções psicológicas superiores no processo de intelectualização pela atividade mediadora, utilizam instrumentos psíquicos superiores e, seus mecanismos de memória, análises, sínteses e outros, modificam e transformam as suas próprias estruturas e funções psíquicas desenvolvendo um pensamento em conceitos.
Passando de gerações a gerações, historicamente, os homens criam símbolos externos portadores de conteúdos de sua cultura, os quais são incorporados na personalidade como signos internalizados para compor singularmente o pensamento em conceitos para a interpretação da concepção de mundo ao qual pertencem, e interagem socialmente de acordo com a sua consciência.
Além disso, a ação do Espírito não está atrelada as fronteiras do templo e suas reuniões e nem aos limites geográficos. A ação do Espírito é para todos os povos, nações, tribos e línguas e é na integralidade do ser humano, em todas as suas esferas, que a presença do Espírito quer atuar. Vidas repletas de necessidades, com suas trevas, ruínas e cisões e que pelo agir do Espírito são levadas à uma vida harmoniosa em comunidade. (SOUZA; PEREIRA, 2018, p.188)
A personalidade se estrutura na complexificação da subjetividade da objetivação e apropriação dos reflexos do meio social (exterior) desde o início do nascimento num processo contínuo de formação e desenvolvimento dos processos de objetivação e de apropriação. A consciência constituída pelos polos cognitivos e afetivos como unidade se transforma no movimento do processo de aprendizagem e da apropriação de conhecimentos (objetos) de uma cultura, na humanização com outros sujeitos na escola, na interação com outros humanos em grupos sociais ou grupos religiosos.
Assim, a cultura assume uma dimensão que engloba vários campos dos saberes e conhecimentos para se tornar uma totalidade complexa de valores, costumes e crenças próprias de determinados povos em seu tempo histórico. A cada tempo essa cultura assume um conjunto próprio de interpretação e de modos de se viver no mundo em uma relação amigável ou de poder com outras culturas diferentes. No caso do Brasil a nossa cultura é um complexo cultural por termos uma história de formação cultural que envolveu diversas culturas para a constituição da formação do povo brasileiro, entre as matrizes culturais as principais são as de origem indígenas, africanas e europeias.
A cultura brasileira é plural. O reconhecimento do pluralismo cultural é não apenas algo que pode contribuir para quaisquer grupos, mas algo que parte de dentro da própria cultura brasileira, que não é homogênea nem etnocêntrica. Cada vez mais é necessário o reconhecimento do pluralismo cultural, que valoriza a riqueza e a singularidade de cada cultura em particular. E ainda: nenhuma cultura está sozinha, mas estão em relacionamento umas com as outras. A relação entre culturas, quando assumida de forma respeitosa, dialógica e fraterna promove mais cidadania, harmonia e paz. Por essa razão, será necessário não apenas o reconhecimento da diversidade cultural, mas, sobretudo, uma relação entre as culturas. É na relação que o crescimento acontece de forma concreta. (LIMA, 2017, p.1025).
Na superação ao marxismo sobre as relações com o mundo concreto a divisão entre corpo e espírito deixa de existir, em nosso íntimo descobrimos caminhos que nos levam a um processo de espiritualização que transcende a condição material humana de pertencimento a um grupo social humano, em comunhão espiritual passamos a agregar outros valores que são suficientes para transformar a personalidade e superar o que éramos no passado e termos outra roupagem por assumirmos um compromisso com a ação do Espírito Santo em nossas vidas.
Ao receber o paráclito, “o Espírito da Verdade, ele vos
conduzirá à verdade plena, pois não falará de si mesmo, mas dirá tudo o que tiver
ouvido e vos anunciará as coisas futuras.” (BÍBLIA, João, 16,13).
O processo de internalização como um processo comunicativo entre pessoas, entre o Espírito Santo para a pessoa, a consciência de si mesmo, de seu mundo particular e singular se constitui em processos de subordinação a um sistema de relações hierarquizadas que se inicia na interação familiar e social, nos processos de escolarização, nos interesses, na descoberta de sua sexualidade, na sua consciência e trajetória de vida, enfim, são processos de ressubordinação de seus motivos em uma atividade significativa para se tornar um sentido de vida.
Nesse sentido pessoal que nos move em sociedade, a personalidade representa um papel na interação com o outro, uma personificação que expressa as relações humanas como manifestação de sua identidade ao estar representando um papel social. Para dar o movimento nessa dinâmica social, cada qual tem seus motivos e interesses para encontrar um sentido de vida. A subjetividade prevalece sobre a objetividade, mas podemos perder o senso de realidade pela falta de objetividade e a fantasia tomar conta do pensamento ao criar um cenário capaz de imaginar que tudo podemos realizar sem que haja uma consequência desfavorável, por estarmos próximos da intervenção do Espirito Santo em nossas vidas.
Por consequência, o Espirito Santo assumiu um papel de pessoa, ao estar de nosso lado como paraclito, a nossa relação de proximidade estabelece vínculos espirituais e interpessoais aos quais as características e os traços humanos sobressaem na nossa interpretação e compreensão sobre o Espirito Santo como pessoa. Na verdade o Espirito Santo esta em outra dimensão, na dimensão espiritual em uma realidade supra-humana que não percebemos com precisão as suas qualidades e que podemos qualificar como divinas em relação as qualidades humanas. Na concepção da doutrina crista o Espirito Santo assume o papel de pessoa na Trindade, interliga o Pai (Deus) ao filho pela Trindade em um só corpo espiritual, também, pela ação do Espirito Santo há a realização da obra divina no mundo humano por ser a manifestação espiritual como fator de movimento para a concretude da onipotência, onisciência e onipresença de Deus.
3 METODOLOGIA
O que apresentamos em nosso trabalho de produção de sínteses sobre o conceito de personalidade evidencia que a unidade afetivo-cognitiva entrelaça-se nos processos de aprendizagem ao contribuir com o desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Mostramos ao elaborar as sínteses teóricas deste estudo que há algo além da matéria que chamamos de mundo espiritual.
Ainda pelo próprio método do materialismo dialético, buscamos respostas para nossas indagações centrais e objetivas sobre o conceito de personalidade e suas relações com a cultura na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural.
O processo de desenvolvimento da personalidade é um processo contínuo de aprendizagem, um automovimento de transformação do psiquismo e da consciência, que ocorre continuamente desde a infância: um processo de desenvolvimento do caráter ao interiorizar e agregar valores de aspirações, atrações, motivos e interesses por meio dos quais na fase da adolescência, os jovens dentro de suas possibilidades de vida encontram sentido para promover uma possível orientação de sua conduta social e inserção na sociedade.
Uma compreensão parcial sobre a pessoa e a constituição de sua personalidade, ao qual está envolvida em uma complexificação entrelaçada de relações sociais para constituir elementos da essência humana, a modificação desta personalidade que herdamos da contribuição cultural, histórica e social vem de contraponto para podermos responder à pergunta: a personalidade pode ser transformada pelo Espirito Santo?
A gênese da personalidade consiste da dinâmica dos motivos que se expressam em relações de subordinações aos correlacionamentos entre si para se tornar constituintes de um sistema de vínculos que conferem um sentido pessoal. Um sistema dinâmico que em movimento produz um processo contínuo de formação da personalidade no mundo psíquico que chamamos de mundo espiritual.
Assim, concluímos que a revisão bibliográfica teve como objetivo o de apontar os aportes conceituais para subsidiar a compreensão do conceito de personalidade, na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural, fundamentais para a produção das sínteses teóricas a partir de parte da obra de Vigotski como contraponto para a compreensão do Espirito Santo. Consultamos outras fontes de artigos sobre o Espírito Santo, denominados de pneumatologia ou paracletologia, entretanto encontramos artigos de cunho dogmáticos ou doutrinários de determinadas religiões cristãs, pentecostais ou carismáticas, que propagam os seus pontos de vista para compreender o Espírito Santo. Nossas vivências e experiências teológicas conduziram a pesquisa bibliográfica para a produção desta síntese teórica sobre a compreensão da formação da personalidade no mundo concreto para o mundo espiritual.
4 CONCLUSÃO
Para termos possibilidades e maneiras de vivenciar as relações inter e intrapessoais, a imaginação é alimentada pelas dimensões culturais, religiosas, da moda, da mídia e suas manifestações artísticas, às quais cada grupo social pertence, em determinada esfera cultural ou a uma identidade espiritual que os move como interpretadores de um mundo concreto. Por outro lado, as distâncias geográficas deixaram de ser barreiras para uma boa parte da população, visto que o mundo virtual estreitou as distâncias na formação de sua rede social.
Mas pensar sobre cultura é pensar em múltiplas manifestações espirituais que surgem ao longo da história humana, subjetivas ao agregar valores e modos de viver para formar parte de uma superestrutura social. Suas raízes estão presas a ideologias dominantes de cada momento histórico, da tomada de poder por determinados grupos, da articulação política para manter a ordem e o bem-estar social. Assim, a cultura é consequência de regras e normas para uma conduta social, e está de acordo com as conquistas que cada grupo conseguiu desenvolver na sociedade por meio do poder econômico, político e religioso.
A formação da personalidade, mediado pela educação escolar, ainda é um tema pouco estudado e que envolve posições contraditórias na contemporaneidade. Ao considerarmos os pressupostos teóricos estudados neste trabalho, o processo educativo participa das complexas transformações do desenvolvimento do psiquismo, mas um processo de humanização intencional com a finalidade de proporcionar a apropriação e objetivação dos conhecimentos de arte, filosofia, história, linguagem e outros para a formação de um pensamento dialético enriquecido pela produção cultural como possibilidade de desenvolvimento das funções psicológicas superiores, da consciência e parte da personalidade. A outra parte que desenvolve a personalidade e modifica ao longo de experiências e vivências em uma religação e interligação com o mundo espiritual, ao estarmos imersos na sobreposição de mundos ao qual pertencemos como corpo e espírito.
Contudo, o passo de superação da Teoria Histórico-Cultural surge ao considerarmos o Espírito Santo como promotor do desenvolvimento da transformação da personalidade humana ao conduzir a pessoa na descoberta de Verdades sobre a vida e a morte, ao estabelecer a aliança entre o homem e Deus, e por desenvolver mudanças de comportamentos e atitudes perante a vida ao trazer um sentido de vida espiritual de religação do mundo concreto ao mundo espiritual. Um elo espiritual necessário para estar próximo da pessoa, graças encontrada quando o Espírito Santo assume a forma de pessoa, ao estar ao lado e se tornar um paráclito.
Portanto, o Espírito Santo age na transformação da pessoa e de sua personalidade promovendo mudanças sensíveis sobre o sentido da vida por meio de dons espirituais que transformam as palavras do emissor ao agregar conhecimento e sabedoria, fortalece a fé, amplia a capacidade de compreensão e discernimento sobre espíritos, pela verdade revela o futuro por meio de profecias, e se manifesta pelo dom de falar e compreender línguas estrangeiras ou ser um porta voz das maravilhas divinas da Obra de Deus.
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[1] Duarte (1996, p. 18), em seus estudos acadêmicos sobre a obra de Vigotski, nomeia de Escola de Vigotski tendo como “ponto de referência a obra como um todo de Vigotski e também o enorme conjunto de trabalhos elaborados por nomes como Leontiev, Luria, Galperin, Elkonin, Davidov, Zaporózhets, e outros integrantes da Psicologia Histórico-Cultural”.